Caixa da auto-sabotagem

Faz tempo que venho dizendo a mim mesma para escrever alguma coisa pra cá. Chego a ensaiar frases na mente, até. Mas no último minuto mudo de ideia e vou fazer outra coisa. Convenço a mim mesma de que posso deixar pra depois. Pra algum outro momento, quando tiver algo de interessante pra contar, quem sabe. 

Acontece que, pelo menos para mim, os dias têm sido feitos de mini-interesses, e não de acontecimentos grandiosos, e aí no fim das contas eu não escrevo nada. Deixo a vontade pra outro dia. Adio palavras que sequer sei se tem alguém para ler, unicamente porque meu cérebro adora brincar de auto sabotagem. 

Mas ontem foi dia de terapia. Dia de ouvir como tenho, sob o pretexto do medo e do esgotamento (que são reais, mas nem de longe tão grandes ou indestrutíveis quanto minha mente gosta de pensar) deixado de tentar fazer as coisas que me proponho. Tenho, nas palavras da terapeuta, “me escondido numa toca, com medo de deixar as pessoas me verem”. 

Minha terapeuta não sabe desse meu projeto de textos aleatórios. Não contei a ela dessa minha vontade de esvaziar um pouco da minha cabeça despejando palavras no papel, mas… gosto de pensar que essa é pelo menos uma tentativa de colocar a cabeça para fora da toca e olhar pro lado de fora por alguns minutos. 

Com isso em mente, vou deixar nesse texto um compromisso: o de escrever uma vez por semana, mesmo sem ter nada de “relevante” para contar. Manter este como um espaço de desafogo, uma espécie de “caixinha dos pensamentos”, só que compartilhada com quem quer que por acaso se depare com minhas palavras na caixa de entrada do e-mail. 

Quanto às novidades que fazem parte de toda a ideia de uma newsletter, tenho apenas uma referente ao campo da escrita: uma nova história, nascida de um exercício feito durante a pós de Escrita Criativa que estou cursando (obrigada pelo incentivo, Mari!). 

Essa é, em essência, uma história sobre ressentimentos. Sobre como, por vezes, ficamos tão arraigados em nossas dores e mágoas que se torna difícil lembrar das pessoas que éramos antes de tudo começar a ruir. 

A protagonista, a capitã de um navio pirata chamada Taliria, é decididamente a pessoa mais cabeça-dura e rancorosa que eu já tive a oportunidade de escrever. A voz dela, porém, é alta e clara, do tipo que se faz ouvir mesmo diante de uma feroz tempestade e, embora alguns passos do caminho venham sendo mais desafiadores que outros, tem sido uma aventura interessante descobrir onde essa história vai dar. 

Mantendo-me ao tema de histórias de alto-mar, vou terminar esse retorno com uma indicação de leitura: o último livro que li, Longa Pétala de Mar da Isabel Allende. A história de um jovem médico catalão e sua amiga pianista que, fugidos das agruras da guerra civil espanhola, vão buscar asilo no Chile efervescente, tão distante e ao mesmo tempo praticamente no centro das disputas políticas em voga no fim dos anos 1930 e começo dos 1940. 

Uma história emocionante, a deste livro. Envolvente e tão real que, em certas ocasiões, chegou a me causar um calafrio ou dois. Quase como se eu também estivesse lá, lidando com todas aquelas perdas, chorando das mesmas dores. 

Em tempos de acompanhar o mundo ebulindo em novas loucuras, relembrar o passado, ainda que pelas vias ficcionais, me parece de suma importância. É como costumava dizer um dos meus professores favoritos de história na época do colégio: “quem não lembra repete, e quem não conhece desaparece”.